terça-feira, dezembro 08, 2009

Bandeiras vermelhas e papais noéis


O encontro de bons amigos em um bar diferenciado e frequentado por intelectuais da região central de São Bernardo terminou mal. Discussão, gritos, ofensas, indiscrições e pelo menos uma amizade abalada.A brincadeira não foi inocente.

Apesar do elevado número de cervejas importadas na mesa, o nível de embriaguez não poderia ser usado como desculpa para o que foi dito. A intenção era mesmo alfinetar, machucar, cutucar, ferir, como um desabafo, ainda que tardio.

Era a enésima vez que os quatro amigos discutiam a respeito da evaporação da militância petista e de outros partidos de esquerda. As discussões eram frequentes, nunca tinham conclusão, só desilusão.

Só que, desta vez, terminou em briga e mais amargura. Tudo porque o mais velho e mais sarcástico ousou ironizar a falta de pegada e de interesse daquilo que um dia foi a militância que carregou o partido nas costas. “Militante petista que tremula bandeira hoje não o faz por menos de R$ 50 por dia. Estão cobrando mais do que os papais noéis da (rua) Marechal (Deodoro).”

O tom sempre foi duro e cruel. Os dois mais velhos bradavam contra a escolha pessoal do presidente Lula do candidato a presidente em 2010. Dilma Roussef tem a oposição de certa parcela petistas que tolera a submissão do partido ao Palácio do Planalto em todo e qualquer assunto.

Os dois mais novos reclamavam da falta de visão e do saudosismo de um partido que não existe mais, de um tempo que não volta mais. Foram bruscamente interrompidos por um palavrão: “Mensalão não dá!”

A conversa acabou. Um dos mais novos se levantou, falou um palavrão de verdade e foi embora. Sem pagar. O outro mais novo ficou bravo, foi se refugiar no balcão e choramingar para o barman.

O dois mais velhos, em vez de sorrir por mais uma vitória conceitual sobre o que pode ser chamado hoje de juventude petista, olhavam fixamente para as garrafas de cerveja com desalento.

Um murmurou: “Por que é que nos tornamos nisso? Será que vamos nos tornar vazios e pragmáticos que nem esses caras?”

Dois minutos depois de um silêncio ensurdecedor, o outro responde: “Lula disse outro dia que a imprensa não tem que investigar, só noticiar. Será que ele toparia esse esquema 15 anos atrás, quando a imprensa investigou e expôs a podridão dos anos FHC?”

Mais dez minutos de silêncio ensurdecedor, e o mais bêbado falou: “Tem salvação? Será que conseguiremos resgatar ao menos a dignidade de quem lutou por 29 anos por este partido?”

O outro não respondeu. Mas eu gostaria de ter retrucado: “É possível, ainda dá tempo, mas o tempo está acabando. E bastante rápido.”

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