sábado, dezembro 31, 2011

Cerveja pode ser banida de qualquer tipo de propaganda

Se você é contra o excesso de intervenção do Estado na vida privada, determinando até mesmo onde você pode fumar ou não, então prepare-se para mais um “atentado”: qualquer tipo de publicidade, propaganda ou menção envolvendo marcas de cerveja – incluindo patrocínio de eventos diversos – poderá ser proibido em todo o País. Isso pode acontecer se o relatório do deputado federal Givaldo Carimbão (PSB-AL) for aprovado pela Comissão Especial de Políticas Públicas de Combate às Drogas da Câmara dos Deputados, no próximo dia 7 de dezembro. Com o aval da Comissão, a proposta será encaminha à presidente Dilma Rousseff, que poderá transformá-la em medida provisória. Carimbão afirma que fez o relatório a partir de um estudo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp): adolescentes estão começando a beber cada vez mais cedo, o que influencia a dependência química e o uso de drogas ilegais. “A Unifesp lançou um livro informando que há anos 20 anos se começava a beber aos 15 anos de idade. Hoje a iniciação começa aos 11. Quem começa a beber antes dos 18 tem cinco vezes mais chance de se tornar um dependente. Como a propaganda incentiva este consumo, concluímos que o fim dela é uma forma de prevenção”, declarou o deputado ao Jornal da Tarde. O problema é que este assunto não é novo: vetar este tipo de publicidade tem respaldo em todo o País, já que entidades civis, parlamentares locais e órgãos públicos de todos os Estados brasileiros enviaram à comissão pedidos de proibição às propagandas de cervejas, destilados e demais bebidas, baseados nos resultados de audiências públicas realizadas em vários municípios. O tema divide juristas, mas surpreendentemente há um apoio grande a este tipo de ação. É censura? Para alguns sim, pois interfere no direito do anunciante de oferecer informação, ainda que por meio de publicidade, ao cliente – informação de um produto legalmente autorizado e que pode ser legalmente vendido no Brasil. Também interfere no direito do consumidor de ter acesso a esse tipo de informação sem que tenha de esperar a tutela do Estado para determinar o que ele pode ou não pode ver, o que ele pode ou não saber sobre qualquer produto. Os defensores da restrição a esse tipo de propaganda – na verdade, veto total – dizem que se trata de uma questão de saúde pública e de prevenção a um vício considerado tão terrível quando o das drogas ilícitas. Debates longos e acalorados não faltarão em 2012. Além da proibição da publicidade em meios de comunicação e eventos, o relatório propõe outras medidas para reprimir o uso do álcool, como proibir a venda de bebidas alcoólicas em lojas de conveniência em postos de gasolina e colocar alertas dos riscos do consumo exagerado nos rótulos das embalagens, como já acontece com o cigarro. O documento sugere ainda o aumento de impostos sobre a venda de bebidas. A Companhia de Bebidas das Américas (Ambev), maior cervejaria do Brasil, e a Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe) não se manifestaram sobre o assunto.

quarta-feira, dezembro 28, 2011

Tocar CD e operar toca-discos não transforma ninguém em artista ou torna alguém músico

Um interessante personagem da vida musical brasileira atual é o músico e produtor cultural Clemente Nascimento, líder da banda Os Inocentes e profissional de múltiplas atividades: toca na sua banda e na atual formação da Plebe Rude, apresenta um programa de TV na internet e arruma tempo para “discotecar” (acho a palavra mais adequada) em algumas casas noturnas – coisa que ele acha bastante divertida. Essa sua última atividade pode eventualmente lhe rende alguma remuneração, mas é essencialmente uma curtição para quem gosta e vive de música. Mas ele não tem ilusão: é um DJ (disc-jóquei) ocasional. Essencialmente é um músico, mas nas casas noturnas ele não “toca”, ele “discoteca”. São coisas bastante distintas, mas tem gente que insiste em misturar as coisas. Lembrei de Clemente quando recebi um convite fazer uma atividade semelhante em uma festa em um bar moderninho de São Paulo neste mês de dezembro. Era um convite que necessitava de confirmação posterior, como é comum neste casos. Prevendo o tipo de mico que isso poderia se tornar, não resisti à provocação. “Você vai ‘tocar’ e fazer a seleção de uma série de músicas legais dos anos 60, essencialmente rock inglês, algumas coisas óbvias e a maioria nem tanto”, disse a simpática amiga de um amigo que agitava a festa. Em seguida ela diz: “Acho que você não vai estranhar ao operar as pick-ups (toca-discos) e toca-CDs múltiplos, vai fazer uma performance legal.” “Na boa, dá menos trabalho se eu fizer a seleção na minha casa, gravar em um CD ou mídia de DVD para deixar rolar. Ou quem sabe até mesmo um pen drive. Aí todo mundo se diverte. Afinal, DJ não passa de um tocador de disco e de CDs”, emendei sem que ela tivesse tempo de pensar. É claro que o convite não foi confirmado – e se tivesse sido, teria sido retirado, de tão feia que foi a cara de decepção e até de nojo quando expus o que achava da atividade de DJ. Respeito quem faz isso, quem gosta de discotecar e até quem ganha dinheiro com isso. Entretanto, DJ pode ser qualquer coisa, menos músico. Faz qualquer coisa, menos tocar. Aparentemente não há muito o que discutir sobre isso, mas há gente que insiste em brigar com os fatos, em espancar e torcer a realidade. Não bastasse essa ridícula confusão de conceitos, a coisa ainda piora: esse mesmo pessoal que acha que DJ “toca” acredita que música eletrônica é música. Não é. É apenas barulho, e dos mais irritantes. Esse tipo de tosqueira voltou a se proliferar neste século. A quantidade de bares e casas noturnas aumentou muito em cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, por exemplo. O mercado ficou bom para os tocadores de CDs (ou MP3, ou vinis, ou qualquer outra coisa). O lado ruim é que a música eletrônica disseminada pelos tocadores de qualquer coisa voltou com tudo, até porque a tecnologia facilitou demais a produção dos barulhinhos computadorizados. E quem faz essa coisa acha que é artista de verdade. Os recursos eletrônicos sempre foram levados em consideração a partir do momento em que se inventou o abominável sintetizador, no finalzinho dos anos 60, trambolho barulhento que encantou gente decente como George Harrison (Beatles) e Pete Townshend (The Who). Quando usado de forma inteligente e criativa, sem abuso, o sintetizador até que foi útil, como nas trilhas sonoras compostas por Harrison e nas obras-primas “Who’s Next” e “Quadrophenia”, do Who. Infelizmente, por outro lado, foi responsável por algumas das maiores porcarias já feitas dentro do rock. Boa parte dos músicos consagrados e mesmo os de apoio costumam ser diplomáticos ao falar do uso de elementos eletrônicos em seus trabalhos, mas simplesmente ignoram o que conhecemos por música eletrônica, aquele barulho artificial e insuportável das pistas de dança. Alguns aceitam que produtores criem arranjos com base em barulhos de computador, outros até brincam com os mesmos barulhinhos que os DJs e os incluem de forma discreta em seus trabalhos. Mas são poucos os artistas sérios que realmente fazem uso desses recursos de forma explícita e escancarada. Dois gigantes do rock cometeram trabalhos péssimos nos últimos 20 anos, seduzidos pela suposta “modernidade”. Eric Clapton escorregou feio com “Pilgrim”, de 1998, CD no qual suas guitarras foram soterradas por arranjos eletrônicos e barulhos artificiais. Jeff Beck, outro gênio da guitarra, caiu na armadilha e gravou os insuportáveis “Jeff”, de 2001, e “You Had It Coming”, de 2003, sendo que já flertava com o estilo em 1999 no álbum “Who Else!” Beck gostou do resultado de sua ousadia, mas muitos fãs não. O jeito foi voltar ao rock, ao blues e ao jazz para gravar “Emotion & Commotion”, seu último trabalho. É possível ficar dias e dias colhendo exemplos para torpedear o barulho eletrônico. Quem gosta deste tipo de música se contenta com muito pouco. Isso não é música, e DJ não é músico, é um tocador de CD. No máximo, animador de festa. DJs que acham que são artistas não merecem respeito. São o que são, o que já é demais.