sexta-feira, setembro 02, 2011

Desde quando Jovem Guarda e Erasmo Carlos fizeram rock?



A música brasileira anda em festa desde o ano passado com uma tonelada de efemérides que nos atormentam a todo momento. Vai desde os 70 anos de Roberto Carlos aos 15 anos das mortes de Chico Science e Renato Russo.

A efeméride da vez são os 70 anos de idade de Erasmo Carlos, o eterno comparsa de Roberto Carlos. Negar as importância do cantor na música e na cultura brasileira é brigar com os fatos, é tentar estuprar a notícia. Não se trata disso – aliás, parabéns pela longeva carreira. Ponto.

O que mais incomoda nas comemorações dos 70 anos de Erasmo Carlos é a constante associação do nome dele ao rock. Desde quando o que ele fez nos anos 60 – e principalmente nos anos 70 – era rock? No máximo um popzinho chocho e de qualidade bastante questionável.

Nem é o caso aqui de ficar dissecando tecnicamente o trabalho do cidadão, como alguns leitores deste Combate Rock “exigem” apenas para espezinhar. A questão é simples e básica: desde quando o que Erasmo Carlos fez em toda a sua carreira era rock?


Erasmo Carlos comemora 70 anos de idade em show no rio com a presença de Roberto Carlos (Foto: MARCOS ARCOVERDE/AGENCIA ESTADO/AE)

Que a Jovem Guarda foi um movimento importante dentro da cultura brasileira não há dúvida. Mostrou que os jovens do começo dos anos 60 no Brasil tinham voz, vontade própria, talento e inteligência.

Mais do que isso, não queriam ficar presos às correntes monolíticas da MPB clássica do samba-canção e das marchinhas de carnaval nem às limitações do pseudo-intelectualismo da bossa nova – não é por acaso que a Jovem Guarda é mais relevante como movimento musical e cultural na história brasileira do que a bossa nova e o tropicalismo.

Por outro lado, a associação de Jovem Guarda com o rock soa artificial e forçada. Só porque era um movimento jovem?

Os primeiros vestígios de rock no Brasil só podem ser identificados em uma série de grupelhos de copiavam os Beatles e grupos americanos, como Renato e Seus Blue Caps, e, com grande dose de boa vontade, nas primeiras gravações de Raul Seixas nos primórdios dos anos 60 – que pouquíssima gente conhece ou sabe da existência.

Rock mesmo começou a ser feito de verdade no Brasil quando a beatlemania estava quase extinta. Foi quando apareceu por aqui Ronnie Von e os Mutantes, ao mesmo tempo em que alguns artistas da Jovem Guarda – com Roberto e Erasmo Carlos liderando – resvalavam, bem de leve, em tentativas frustradas de produzir algum tipo de “rock”.

Tal associação era benéfica à Jovem Guarda? Alguns historiadores dizem que sim, até porque Beatles, Rolling Stones e o rock em geral se tornaram moda mundial a partir de 1965.

A associação ao rock era uma forma de legitimar o movimento jovem da música brasileira que, de certa forma, era integrada por uma classe média que se consolidava e que era emergente, em contraponto ao elitismo da bossa nova e da MPB classuda e ao populismo e massificação do samba.

A tese até que faz algum sentido. No entanto, academicismos à parte, ainda que a associação Jovem Guarda-rock fosse necessária para atribuir credibilidade (ao menos mercadologicamente), soa muito forçada e quase sem nexo quando se escutam os principais hits da época – e principalmente que tipo de música os principais protagonistas produziram depois.

A analogia vale neste caso: depois do espetáculo lamentável que o time do Palmeiras proporcionou na partida contra o América-MG há alguns dias (1 a 1) e depois de uma atuação sonolenta do Corinthians na vitória de 1 a 0 contra o Atlético-GO, um jornalista do Jornal da Tarde comentou: “Palmeiras e Corinthians não praticam o mesmo esporte que o Barcelona (campeão europeu de 2011). Se os dois times jogam futebol, então o Barcelona pratica outra coisa.”

Pois bem. Se Erasmo Carlos e a Jovem Guarda algum dia fizeram rock, então Led Zepelin, Deep Purple, Black Sabbath, Beatles, Rolling Stones, Jimi Hendrix, Who e outros fizeram (ou fazem) outra coisa…

segunda-feira, agosto 29, 2011

Coverdale-Page: Quem perdeu fomos nós



No auge da fama do Whitesnake, entre 1987 e 1990, David Coverdale concedeu uma entrevista a uma revista inglesa onde desdenhava de algumas músicas do Led Zeppelin e sobre supostas acusações que estava recebendo por ter plagiado ou ao menos ter copiado trechos de outras músicas em suas composições.


“Isso é bastante questionável. Se formos levar a fundo mesmo, então mudaremos a história e o Led Zeppelin terá de pagar um dinheirão para Willie Dixon (bluesman norte-americano). Ele é o ‘verdadeiro’ autor do primeiro LP do Led”, disse Coverdale.

A falta de jeito e de educação espantou quem o conhecia. Afinal, desde os tempos de Deep Purple que ele havia deixado o estilo polêmico para lá. Recentemente, um jornalista brasileiro tentou lembrá-lo sobre a declaração durante uma entrevista por telefone, mas o cantor inglês desconversou e afirmou não se lembrar daquelas palavras.

O curioso é que, para se defender à época, acabou atacando Jimmy Page, o principal compositor do Led Zeppelin. Pouco tempo depois, Coverdale pareceu não se importar em trabalhar com um “plagiador”.

O projeto que reuniu os dois era secreto em meados de 1991. Foi de ideia do estafe de Page convidar Coverdale para um projeto de hard rock mais pesado, já que Robert Plant recusara nova proposta de reativar o Led Zeppelin. Coverdale ficou entusiasmado e aceitou conversar e tomar umas cervejas com Page e seu empresário para ver se rolava algo.

Dois depois, estavam na casa do guitarrista para algumas jams no estúdio caseiro do local; um mês depois, estavam assinados os contratos para que o Coverdale-Page, nome escolhido para o projeto.

E tudo foi feito em segredo, que conseguiu ser mantido até o começo de 1993, quando ninguém conseguia entender o porquê de o vocalista ter desfeito o Whitesnake após a turnê de estrondoso sucesso de 1990.



Clássico álbum da dupla
“Coverdale-Page”, álbum homônimo lançado no meio de 1993, é uma obra-prima do hard rock, mesclando a veia mais popular de Coverdale e o peso das guitarras zeppelinianas de Page.

O vocalista foi criticado à época por exagerar nos agudos em algumas músicas, o que foi encarado como uma tentativa de emular as performances de Robert Plant nos tempos áureos do Led, na década de 70.

É fato que Coverdale forçou um pouco, mas nada que tire o brilho de músicas fantásticas como “Absolution Blues”, “Shake My Tree”, “Take Me For a Little While”, “Whisper a Prayer for the Dying”, “Pride and Joy” e “Over Now”.


O entrosamento entre os dois músicos foi total, desde as jams na casa de Page até as jams realizadas no Japão como aquecimento para a turnê. O problema é que tudo estava indo bem demais, todo mundo estava feliz demais, e isso é um perigo em se tratando de Jimmy Page.

Há quem diga que o guitarrista é notório por ser perseguido pelo azar ou por “maus fluidos”. Seja como for, o que deu muito certo nos bastidores e nos ensaios ficou esquisito nos palcos.

As primeiras performances no Japão foram ótimas, mas depois a coisa começou a complicar. Os empresários de Page começaram a se incomodar com as performances bombásticas de Coverdale, além das vendas decepcionantes, apesar de boas, do CD. Eles achavam que choveriam convites para turnês pela Europa e Estados Unidos, mas isso não ocorreu.


Após sete shows no Japão Page foi praticamente obrigado pelos empresários a “descontinuar” a dupla por medo de fracasso financeiros no resto do mundo. Isso não afeitou a amizade entre os dois, mas Coverdale não poupou críticas e acusações pesadas contra os empresários de Page. Nem mesmo um CD excelente fui suficiente para manter esse projeto em pé.

Alguns anos depois, em 2000, durante entrevistas para divulgar o álbum solo “Into the Light”, Coverdale insinuou que a parceria não foi em frente porque já havia conversas bastante adiantadas entre os empresários de Robert Plant e Jimmy Page para retomar o Led Zeppelin ou fazerem um trabalho em dupla.

Seja como for, Coverdale parecia ter razão. Page e Plant voltaram a tocar juntos em 1994, quando gravaram um especial para a MTV que aabou sendo lançado em DVD e CD com o nome de “No Quarter: Jimmy Page and Robert Plant Unledded”.

Quatro anos depois foi lançado o CD “Wlakin into Clarksdale”, totalmente com músicas inéditas, sendo que a parceria chegou ao fim no ano seguinte. Assim como o BBM – o Cream de Eric Clapton sem o mesmo, com Gary Moore em seu lugar –, o Coverdale-Page foi um grande projeto que não vingou por questões puramente comerciais. Quem perdeu fomos nós.