sábado, março 12, 2011

Metal, erudição e muita qualidade



O TEMA É MÚSICA
por Marcelo Moreira



Kiko, do Angra: experimentalismo instrumental
Música popular instrumental de qualidade no Brasil quase sempre ficou restrita ao chorinho e ao chamado brazilian jazz, que misturava bossa nova, MPB e dixie jazz.

No rock, sempre houve algumas tentativas isoladas de ótimos artistas e instrumentistas com trabalho autoral em bandas ou mesmo em trabalhos solo, mas que, quando partiam para algo mais alternativo, esbarravam ora no virtuosismo, ora na falta de feeling pura e simples.

Recentemente tivemos exemplos interessantes, mas de pouca repercussão, infelizmente. Andreas Kisser, guitarrista do Sepultura, lançou no ano passado “Hubris I and II”, um trabalho distante do heavy metal, com muita influência da música brasileira, música árabe e do jazz, além de investir pesado no experimentalismo.

Kiko Loureiro, guitarrista do Angra, já tem três trabalhos solos excelentes - “No Gravity”, “Universo Inverso” e “Fullblast”. Deixa o experimentalismo de lado e investe mais em sonoridades tradicionais do rock misturadas com influências étnicas da MPB, música africada e oriental.

Rafael Bittencourt, outro guitarrista do Angra, mantém um grupo paralelo, o Bittencourt Project, que lançou há dois anos ”Brainstorm I”, que não é totalmente instrumental, mas tem passagens muito interessantes inspiradas no puro heavy metal.

Eduardo Ardanuy é um dos melhores guitarristas já nascidos no Brasil. Integrante do ótimo Dr. Sin, mantém um projeto solo, o Tritone, onde abusa do jazz rock, e uma carreira solo com o excelente “Electric Nightmare”, álbum pesado, mas com referências ao jazz e à música brasileira.

Merecem destaque ainda instrumentistas fantásticos com trabalhos igualmente excelentes, mas que não recebem a mínima atenção da mídia. São os casos de Silas Fernandes, guitarrista que lançou o bom “14 Years” recentemente; Hélcio Aguirra, guitarrista do Golpe de Estado, e o talentoso baixista Zuzo Moussawer, com três CDs lançados, sendo o mais recente “Express”.

quinta-feira, março 10, 2011

O som espinhoso do Cactus


O TEMA É MÚSICA



Os quatro integrantes da formação original
Márcio Paula Moraes
A banda durou muito pouco tempo, de 1970 a 1972, mas enquanto esteve na ativa brilhou e produziu importantes álbuns para a história do rock n roll.

Formada de uma derivação de músicos vindos também de outras bandas como o Vanilla Fugde, Buddy Miles Express, a formação original do Cactus era composta por Carmine Appice (bateria), Tim Bogert (baixo), Rusty Day (vocal) e Jim McCarty (guitarra). McCarty era da cidade de Detroit (EUA), e muito ligado ao blues – gênero que deu ao Cactus uma grande semelhança com o Led Zeppelin.



Cactus - Cactus: 1º disco da banda
 O som do Cactus oscila entre o rock bruto como em Parchman Farm e o blues como na deliciosa faixa No Need To Worrry, ambas as músicas do primeiro álbum homônimo da banda, lançado em 1970. Dado curioso é que a capa deste disco foi censurada no Brasil pelos censores militares, pois eles entendiam que a foto que ilustrava a capa a capa fazia apologia ao sexo, a um pênis, e foi considerada inapropriada. Foi preciso refazê-la para que o disco fosse comercializado no país.

Em vários momentos o Cactus se assemelha ao Led Zeppelin. Talvez até por uma obsessão americana de ter sempre alguma banda que fizesse frente às inglesas. Vale lembrar que o foi com esse espírito que surgiram outras bandas (muito boas por sinal), como o Grand Funk e o Monkees, essa descaradamente produzida pelos meios midiáticos americanos para ser a opção americana aos Beatles. A banda até teve bons momentos enquanto durou seu programa de tevê na década de 60, nos Estados Unidos, mas francamente, compará-la com Beatles é covardia!

A identificação do Cactus com as bandas inglesas era latente, não só com o Led. Em vários momentos de Oleo, a banda faz lembrar o período dos anos 60 dos Rolling Stones, principalmente a gaita, soprada por Rusty Day, comum nas músicas Stoneanas.

Diante de uma onda avassaladora do rock inglês nas décadas de 60 e 70, parecia que a regra era se alimentar de fontes sadias, e as bandas americanas para fazer frente às inglesas, que arrebentavam pelo mundo afora, era mesmo tentar fazer igual aquilo que estava dando certo. Ao procurar esse assemelhamento com o Led Zeppelin e incutir elementos do blues à sua música o Cactus passou a integrar o grupo de bandas que vinha trabalhando esses conceitos há muito tempo.


2º disco: ainda muito bom
O segundo álbum (One Way... Or Another) lançado em fevereiro 1971 também foi muito bem aceito pelo público e mídia, mas dava sinais que a banda carecia de genialidade para criar. Nele consta um grande sucesso de Little Richard, de1956, Long Tall Sally (também gravada por Elvis Presley). No mesmo ano, em outubro, o Cactus se arriscaria com seu terceiro e último álbum com a formação original completa, Restrictions.

Já sem o guitarrista bluesman Jim McCarty, a banda lançou Ot ‘n’ Sweaty (1972), que dispensa comentários, uma vez que, meses depois a banda se dissolveu.

Em 2006, envelhecida, a banda se reuniu e lançou seu quinto e último álbum, Cactus V, porém com quase todos os integrantes da formação original, trata-se de um belo álbum, mas desprezado pelos próprios fãs da banda que preferem o som antigo. O vocalista Rusty Day morreu aos 36 anos apenas, em junho de 1982.

Cactus foi uma das poucas bandas americanas que entrou para a história do rock num dos períodos mais difíceis, pois para fazer frente ou igualar-se às bandas inglesas não era tarefa fácil, era preciso ser bom muito, mas muito bom. E o Cactus era.

Márcio Paula Moraes é professor e jornalista.

quarta-feira, março 09, 2011

O novo Procon-SP será realmente novo?


Ano novo, Procon paulista novo. Será? É o que o consumidor espera de uma das poucas instituições oficiais que tenta defender o direito de compra ou adquire qualquer tipo de serviços. Sai o diretor-executivo Roberto Pfeiffer, homem culto e letrado, e entra Paulo Arthur Góes, advogado, mas que é funcionário de carreira do próprio órgão há 18 anos.

Pfeiffer herdou há quatro anos um Procon desarticulado, ineficiente, inchado e com funcionários desmotivados. O panorama que Góes, ex-diretor de fiscalização, vai encontrar não será muito diferente.

Não há mais inchaço no quadro de funcionário, e há mais coesão e articulação entre todos os departamentos. Mas a desmotivação continua, e pouco se avançou na coerção das empresas e órgãos públicos infratores contumazes.

A grande crítica que a gestão de Pfeiffer recebia era a de que o Procon-SP multava demais, sem que houvesse resultados práticos que merecessem destaque. Os rankings de empresas que descumprem o Código de Defesa do Consumidor e lesam o cliente não sofreram modificações, o número de queixas só aumenta a cada ano e não se vê os “punidos” preocupados com a “suposta” exposição negativa ao entrar nos tais rankings.

As multas milionárias aplicadas mensalmente também não surtem efeito, não só porque os números de reclamações não diminuem, mas porque as empresas, as concessionárias de serviços e órgãos públicos não pagam. Ou conseguem empurrar as questões em litígios intermináveis na Justiça ou simplesmente contam com a complacência do próprio Procon, que muito tempo depois diminui ou até extingue a multa após vários recursos.

A pecha de “órgão multador” da gestão Pfeiffer vai mudar? Afinal, Góes era o responsável pela fiscalização e multas na administração anterior...

Apesar da situação bastante complicada que Góes encontrou no Procon-SP, há esperança entre as entidades civis que defendem o consumidor, bem como dos próprios funcionários, massacrados por anos de cobrança, promessas não cumpridas e baixos salários.

A esperança reside no fato de Góes ser funcionário de careira do órgão. Conhece, portanto, os problemas, as reivindicações e as necessidades do Procon – bem como seus limites. A preocupação é se ele terá força política para impor suas ideias e conseguir mais atenção e recursos da Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo.

terça-feira, março 08, 2011

Corte do fornecimento de água é legal, mas será que é legítimo?


A companhia de água pode cortar o fornecimento por atraso no pagamento? Pode. A exemplo da luz e do telefone, que também podem sofrer interrupção por falta de pagamento, a empresa de água está, legalmente, autorizada a secar as torneiras de quem não pagar a conta. Essa é uma das dúvidas mais comuns que atingem os consumidores.



E a questão, apesar de constar em lei, ainda é controversa. Afinal, é legítimo e mortalmente aceitável o corte do fornecimento de serviços que fazem parte das necessidades básicas dos consumidores? Afinal, as empresas concessionárias e operadoras dispõem de meios diversos para efetuar a cobrança e punir inadimplentes, seja enviando o nome do cliente para os cadastros de inadimplência, seja processando-o na Justiça.

Foram os investidores, na época das privatizações, que exigiram a suspensão implacável dos serviços essenciais aos inadimplentes. O Congresso Nacional não hesitou em atender à “exigência”, e o governo federal não se importou em contestar ou mesmo defender o consumidor.

As estatais que gerenciavam esses serviços essenciais não deixaram saudade, é fato, já que nunca respeitaram consumidor, prestavam um péssimo serviço, atendiam ainda pior as reclamações e ignoravam as noções básicas de meritocracia – muitas delas eram meros cabides de emprego para apaniguados políticos, o que significava que eram antros de corrupção.

Quando as privatizações vieram – desejáveis, mas que foram implementadas de forma pouco transparente, com suspeitas graves em cada documento assinado -, o corte dos serviços essenciais por inadimplência foi implementado de forma inflexível e contrabandeado por meio da Lei 8.987/95, que autorizou o corte “por inadimplemento do usuário”.

A lei citada apenas criou um requisito para a suspensão do serviço, seja de água, luz ou telefone, a saber: a empresa deve avisar previamente o consumidor, com antecedência de 15 dias, que o serviço essencial será interrompido.

A questão é muito polêmica em se tratando de corte por atraso ou falta de pagamento, uma vez que a interrupção dos serviços essenciais retira o bem-estar mínimo, e muitas vezes colocam em risco a própria saúde (caso da água e luz) do devedor. Durante muito tempo, os tribunais estaduais não aceitavam o corte por inadimplemento. Mas o Superior de Tribunal de Justiça (STJ) acabou com a polêmica e consolidou a regra da suspensão para os inadimplentes.

“O corte por atraso, mesmo que admitido, poderia ser regulamentado de forma a preservar o mínimo da dignidade da pessoa humana. Por exemplo, poderia haver um tratamento diferenciado para desempregados de baixa renda ou pessoas carentes – assim como poderia haver regras mais flexíveis e mais seguras para os consumidores em geral”, diz o advogado Josué Rios, especialista em direito do consumidor e colunista do Jornal da Tarde.

Pelo menos a mesma Justiça que autorizou as concessionárias a suspender o serviço por atraso no pagamento proibiu que as empresas cortassem a água ou a luz no caso de débito passado. E aqui não estamos falando de decisões judiciais isoladas, mas de entendimento pacífico dos tribunais.

Um exemplo comum de débito passado que impede o corte é o que ocorre com o novo comprador de um imóvel, cujo antigo dono não pagou a conta da Sabesp. Neste caso, conforme repetidas decisões dos tribunais, o comprador da casa ou apartamento não pode ser impedido de obter a religação da água em razão da dívida do antigo proprietário.

“Da mesma forma, uma vez que esteja utilizando normalmente o serviço, o novo comprador do imóvel não pode sofrer o corte, se a empresa descobre que tem débito em aberto do antigo vendedor. Mais: se o inquilino abandonou o imóvel devendo a companhia de água, esta deve seguir os rastros deste para cobrar o débito, em vez de impedir o dono imóvel de religar o serviço”, conclui Rios.
Wind & Wuthering, o álbum relegado do Gênesis



O TEMA É MÚSICA

Membros do Gênesis: Peter abaixo

Márcio Paula Moraes

Não há dívida de que o Gênesis foi uma das mais importantes bandas progressivas da história do rock. Álbuns como Nursery Cryme (1971), Foxtrot (1972) e Selling England By the Pound (1973), se tornaram referências máximas como obras de artes convertidas em notas musicais.

O vocalista Peter Gabriel foi uma espécie de mentor do Gênesis, uma caricatura musical que exalava criatividade e inovação; um maluco como todo gênio é. A vertente atmosférica de canções como Firth of Fifth, de Selling England..., traduz a essência superior do Gênesis. Uma música para ser ouvida dezenas de vezes e toda vez perceber algo novo nela. Esse encanto musical e a profundidade na teoria do som progressivo talvez sejam os maiores atributos da banda, mas sem dúvida, uma qualidade indissociável de Peter Gabriel.

A formação clássica do Gênesis era composta por Peter Gabriel (vocal), Steve Hackett (guitarra), Tony Banks (teclados e piano), Mike Rutherford (baixo) e Phil Collins (bateria).


Capa do disco Wind Wuthering
Mas em 1976, Peter Gabriel já havia deixado a banda, quando o Gênesis lançou seu sétimo álbum considerado infelizmente por muitos como um álbum fraco: Wind & Wuthering. Com a saída de Gabriel, Phil Collins assumiu o comando da banda e deu um novo “ar” às músicas, e foi justamente com Collins no comando que a banda ficou mais conhecida e produziu músicas de maior repercussão no mundo inteiro.

Wind & Wuthering traz toda a complexidade que envolve o progressivo, mas também promove uma aurora , digamos, “romântica” que algumas faixas denotam. Mas longe de ser um disco romântico, o que caracteriza bastante os discos solo de Phil Collins. Wind & Wuthering foi relegado pelos fãs, principalmente porque o Mentor já não estava mais na banda e a maluquice esvoaçou. Com este álbum, a banda deu um passo à frente, avançou, progrediu...

Não há como negar que Blood On The Rooftops é uma das canções que compõem o cast do Gênesis como uma das mais belas. Só por ela já vale o álbuns inteiro. A harmonia fixada pelos teclados, a marcação irreparável do baixo, a bateria “macia”, e a voz suave de Collins conferem um “som musical” do mais alto nível.

Wind & Wuthering é mais um dos grandes álbuns da banda ao lado de todos os outros anteriores, mesmo sem o Mentor.

Márcio Paula Moraes é professor e jornalista.