domingo, novembro 20, 2011

Será que ainda vale a pena ser músico?

A desorganização do mercado musical por conta da nova realidade digital no consumo e acesso a obras artísticas está provocando crises existenciais em gente já bem estabelecida no ramo. A mais nova vítima é o guitarrista Kiko Loureiro, do Angra, uma das três mais bem-sucedidas bandas heavy metal brasileiras. Em sua coluna na revista mensal Guitar Player brasileira, na edição de agosto de 2011, ele expõe a sua angústia de como será o mercado a partir de agora. Sob o título “A Dúvida”, ele vai direto ao ponto. Vale a pena ser músico atualmente, e ainda mais no Brasil? Ele é constantemente perguntado sobre isso por músicos iniciantes e alunos seus de guitarra. Por mais que ele se esforce, e diga que não tem respostas para isso, ele deixa transparecer uma alta dose de pessimismo. Loureiro cita uma recente entrevista de Prince, multi-instrumentista e cantor pop de muito sucesso nos anos 80, em que declara que “não pretende voltar a gravar ou lançar coisa nova enquanto não for regularizada essa ‘terra de ninguém’ que se tornou a venda e a distribuição de música na atualidade”. Prince termina dizendo que está confuso com sua profissão e que não sabe como ser o seu futuro. O guitarrista brasileiro, de certa forma, corrobora a tese de Prince e reclama do que ele chama de “dízimo” que é pago aos músicos desde sempre – e que deve piorar em tempos de consumo digital desenfreado. “Com razão, Prince questiona que o músico não é mais pago pelo seu ofício e quem ganha são as operadoras de celular, Apple e Google.” O artigo pretende lançar uma ponta de otimismo em seu final, onde Loureiro primeiro questiona se ainda é possível viver música e se “os músicos são pagos pelo que realmente acham que valem”. A conclusão é que não, mas, para ele, “a criação musical nunca foi abortada por causa disso e que por isso é necessário ceder às nossas vontades e se jogar de cabeça na profissão de músico”. A conclusão é bonita, legítima, respeitável e tem ares filosóficas, mas nem passa perto de tentar buscar uma luz no fim do túnel. Loureiro evitou de todas as formas ser alarmista, mas é fato que até ele, músico consagrado internacionalmente, não consegue esconder o desalento que assola a atividade musical. Se o fim da carteirinha da Ordem dos Músicos do Brasil (OMB) é um alento, por outro lado o contínuo desmantelamento do mercado musical impulsionado em boa parte pelos downloads ilegais está colocando a parte mais frágil, o músico profissional, em um beco sem saída. O Combate Rock tem divulgado frequentemente opiniões diversas a respeito dos supostos problemas enfrentados pelo meio musical na questão dos direitos autorais e da remuneração pela produção criativa. De forma simplista, muitos defendem que quem vive de música hoje precisa ser criativo e encontrar soluções principalmente com a ajuda da internet. E discorrem a elencar uma série de iniciativas, quase todas incipientes, de modelos de negócio para tornar rentável, ou ao menos gerar algum faturamento, a partir da produção musical. Tudo muito bonito, mas isso nem de longe resolve o problema. A indústria fonográfica e o mercado musical estão minguando e não existe solução à vista. E não serão as iniciativas incipientes defendidas pelos “modernistas” e “viciados em tecnologia” que vão resolver os problemas no médio prazo. Prince promete que não grava mais nada enquanto não houver regras para disciplinas a 'terra de ninguém' da venda e distribuição de músicas na atualidade E o mais preocupante é que, ao que parece, somente os músicos, talvez a parte mais importante do processo, estão preocupados com isso. O desmantelamento do mercado e o incentivo do “faça você mesmo” tendem a jogar lá para baixo a qualidade do que se produz e do que se ouve atualmente. E as primeiras vítimas desse rolo compressor são os pequenos selos que, mesmo diminutos, faziam um trabalho profissional de seleção e divulgação. A quem interessa a guetificação da música? Como já publicados aqui no Combate Rock, uma das consequências do desmantelamento do meio musical é o fim dos grandes legados e a mediocrização total dominando e se tornando regra. Azar nosso. P.S.: Apenas para acrescentar uma informãção relevante. O crítico musical inglês Simon Reynolds, autor do livro “Retromania – Pop Culture’s Addiction to its Own Past”, declarou recentemente à Folha de S. Paulo que os dowloads de música pela internet e a oferta infinita de música e pordutos associados são “um desastre para artistas e fãs”. Segundo ele, “a cultura digital se fundamenta na facilidade, e a facilidfade de acesso e o custo mínimo de aquisição têm levado a uma depreciação no valor da música e à degradação da experiência audiófila”. Não poderia ser mais preciso.

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