segunda-feira, fevereiro 02, 2009

A soliedariedade sumiu e não volta tão cedo


Em algum momento, a solidariedade desapareceu das grandes cidades brasileiras. Alguns dizem que foi no final dos anos 70 do século passado, quando as sucessivas crises econômicas brasileiras começaram a época dos índices de desemprego de dois dígitos. Outros dirão que foi no começo dos ano 80, ainda no bojo das mesmas crises, quando as favelas explodiram de vez em São Paulo e no Rio de Janeiro, inaugurando o pesadelo da violência urbana nos anos pós-ditadra militar.

Alguns esquerditas mais apressados dirão que a solidariedade desapareceu de vez nos anos 90, quando a abertura indiscriminada dos governos Fernando Collor de Mello, Itamar Franco e Fernando Hnrique Cardoso devastaram parques industriais e jogaram milhares de trabalhadores na informalidade e no desemprego prolongado.

O fato é que a cordialidade e a boa receptividade que os estrangeiros que nos visitam sempre elogiam nunca existiu de fato. Caso contrário, jamais permitiríamos o aumento indecoroso de mendigos na cidade de São Paulo. O endurecimento das relações pessoais nas metrópoles e nas cidades de porte médio ultrapassa qualquer sintoma de crise econômica, de pobreza ou mesmo de abjeta desigualdade de distribuição de renda.

A falta de solidariedade é sintoma de ausência de Estado, como observamos na batalha entre vândalos da comunidade de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, e a Polícia Militar. O que era uma manifestação nada legítima - já que execrava a PM por ter abordado e revidado a uma agressão de um ladrão - se transformou no grito de uma população maltratada e abandonada pela prefeitura de José Serra/Gilberto Kassab.

A baderna promovida por uma turma de vândalos ensandecidos é um sintoma de sociedade que já não está mais doente: está anestesiada. A paralisia atinge desde a PM, instrumento politiqueiro do governo estadual, que titubeou na repressão aos verdadeiros bandidos de Paraisópolis; atinge a população, que não tem para onde correr; e atinge a imprensa, onde apresentadores de TV falastrões e irresponsáveis berram por sague.

Saindo do macro e aterrissando no nosso microcosmo do ABCD, a solidariedade sumiu quando deixamos de olhar para o lado, para fora do carro. O embrutecimento atingiu níveis inimagináveis até mesmo para quem sempre participou de atividades filantrópicas. É cada vez mais comum observarmos nos semáforos de nossas sete cidades toda a sorte de pedintes e oportunistas.

Como discernir entre o que é verdade é o que é golpe? Como identificar naquela criança rota e miserável um instrumento absurdo de pais inescrupulosos? Como não desconfiar daquele rapaz forte que afirma jamais conseguir emprego e pedir dinheiro dentro dos ônibus - e que em seguida vai para o botquim tomar pinga?

No último sábado à noite, chuvoso e mal iluminado, um homem com uma criança no colo, com guarda-chuva e acompanhado por uma mulher, pedia dinheiro no semáforo do Paço Municipal de São Bernardo, em frente ao Teatro Cacilda Becker. A história o denunciava: "acabei de sair do hospital com minha filha e não tenho dinheiro para ir paracasa..."

A mesma história de sempre. Recusei o pedido de dinheiro e tive de escutar: "Tá vendo a crianã na chuva e ainda recusa ajuda. Deus tá vendo..."

Não tenho a obrigação de dar esmola - sou totalmente contra isso. Além do mais, se realmente ele estava no hospital com a filha e sem dinheiro, deveria ter procurado a assistência social da instituição - todo hospital tem uma.

Entretanto, pelo inusitado da reação, creio ter sido um sinal de alerta para que procuremos entender, de alguma forma, o temo em que vivemos em nossa cidade. A solidariedade sumiu e nada indica que nós, habitantes da metrópole, consigamos encontrá-la no médio prazo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário