Parque Antártica comemora 70 anos
Antero Greco, do Estado de S. Paulo
São Paulo - O time do Palmeiras estará vivendo momento histórico, na noite desta quarta-feira, quando entrar no campo do Parque Antártica. Não por conta do clássico com o Cruzeiro, pela Copa Sul-Americana, da qual se encontra a um passo da desclassificação. Mas por causa do próprio estádio, inaugurado 70 anos atrás, numa tarde de 13 de agosto, com goleada de 6 a 0 sobre o Bangu, na primeira edição do Torneio Rio-S. Paulo.
Naquele domingo de inverno, a festa de 30 mil torcedores do clube fundado por imigrantes italianos e seus descendentes foi o coroamento de sonho iniciado na década de 20. Poucos anos após a criação do Palestra Itália (em 24 de agosto de 1914), seus dirigentes chegaram à conclusão de que seria necessária “casa própria” para as apresentações do time.
Uma pesquisa indicou que o local adequado era o campo da Companhia Antartica, no bairro de Perdizes, zona oeste da cidade. Uma comissão presidida por Vasco Stella Farinello foi incumbida de negociar a cessão do local com os alemães Zerrener e Büllow, donos da fábrica de bebidas e do Parque Antarctica.
Os sócios toparam a transação, pediram 500 mil contos de réis – uma fortuna para aqueles tempos –, mas impuseram como condição para selar o acordo que os palestrinos tivessem o consentimento da diretoria do América, time que havia arrendado o estádio.
A missão diplomática foi atrás de Belfort Duarte, antigo zagueiro do clube rival e seu presidente na época. O cartola entendeu a argumentação dos italianos e, com a mesma lisura que apresentou na fase em que corria atrás da bola, abriu mão do contrato de aluguel. Belfort virou símbolo de cavalheirismo no futebol, tanto que até hoje empresta seu nome ao troféu oferecido a jogador jamais expulso na carreira.
O Palestra Itália ofereceu 250 mil contos de réis para a Cia. Antarctica e ficou de pagar mais duas cotas anuais de 125 mil. Além disso, se comprometeu a só utilizar os produtos da empresa em seu campo. No vencimento da primeira parcela adicional, faltou dinheiro e a saída dos dirigentes foi vender parte do terreno do estádio para o conde Francesco Matarazzo, o mais próspero imigrante italiano do início do século 20.
O clube passou mais de uma década para reformar o Parque Antártica. As obras ficaram prontas apenas em agosto de 1933, mas valeu a pena a espera. O estádio tinha arquibancadas de cimento (parte delas cobertas), alambrado (novidade, em termos de segurança), pista de atletismo e estavam sendo construídas quadras de tênis, piscinas e stand de tiro. “As instalações obedecem aos mais recentes preceitos técnicos internacionais”, atestava reportagem de o “Estado de S. Paulo”.
O Palestra queria mostrar, no ano 1 da era do profissionalismo do futebol, que tinha estádio à altura de sua torcida. Por isso, organizou grande festa para a inauguração. O time, em campo, fez sua parte e goleou o Bangu por 6 a 0. Gabardo marcou o primeiro gol do novo estádio e Avellino fez o segundo. Na etapa final, Avellino, Romeu, Gabardo e Romeu de novo completaram a surra. O Bangu jogou tão mal que o goleiro Nascimento “rapou um frio quisilento por não ter tido nada o que fazer”, segundo o ‘Estado’.
Naquele mesmo ano, o Palmeiras ganhou o Rio-S. Paulo, o título paulista e ainda obteve proeza histórica. Em clássico com o Corinthians, já o seu maior adversário, fez 8 a 0 (4 gols de Romeu, 3 de Imparato e 1 de Gabardo). Até hoje, essa é a maior derrota do Timão.
O Palestra Itália mudou de nome por causa da Segunda Grande Guerra, virou Palmeiras em 44, mas nunca mais abriu mão do seu estádio, que leva oficialmente o nome original do clube, mas também nunca deixou de ser conhecido como Parque Antártica. Uma grande reforma ocorreu três décadas mais tarde, quando o gramado foi elevado e surgiu o “Jardim Suspenso” (1964).
No ‘Palestra Itália’, com capacidade para 32 mil torcedores, o Palmeiras festejou vários títulos paulistas, além da Taça Libertadores da América e a Copa Mercosul de 1999. Mas também perdeu a própria Mercosul em 2000 e em 2001, uma Copa do Brasil (para o Cruzeiro, em 96) e foi desclassificado pelo Boca Juniors na semifinal da Libertadores de 2001. E é lá que o time manda seus jogos na Segunda Divisão do Brasileiro.
O Palestra Itália precisa de nova e profunda cirurgia plástica – há anos prometida pela atual diretoria. Mas, mesmo com projeto arquitetônico hoje ultrapassado, é um dos símbolos de São Paulo. Acima de tudo, se trata de um dos muitos marcos da forte presença italiana na cidade. Orgulho de tantos ‘nonnos’ que freqüentaram suas arquibancadas e vibraram com ídolos – de Romeu a César Maluco, de Oberdan Catani e Leão, de Junqueira a Ademir da Guia, de Valdir de Moraes a Rivaldo, Evair, Marcos.