sábado, julho 25, 2020

1965 para o rock: um ano fundamental, o mais importante ou apenas o início de tudo?


Marcelo Moreira

Pode a premissa estar errada, mas ainda assim o livro ser bom e interessante? É raro, mas pode acontecer. O jornalista e historiador norte-americano Andrew Grant Jackson arriscou e se confundiu, esbarrando em equívocos por todo o livro "1965 - O Ano Mais Revolucionário da Música", editado recentemente no Brasil pela editora Leya.

Cravar esse tipo de afirmação em uma obra literária é temerário, ainda mais em um assunto como a cultura pop. Por que 1965, e não 1967, quando obras-primas do rock foram lançadas, ou 1968, ano em que o mundo pop foi influenciado por acontecimentos sociopolíticos? Ou então 1970, que é o ano em que os sonhos acabaram e a arte ficou mais "profissional"?

Jackson expôs muitos argumentos em 330 páginas e não convenceu - não conseguiu provar categoricamente que 1965 foi o ano mais importante da música pop.

No entanto, com um texto leve e informativo, e com toneladas de referências, cometeu uma obra importante, onde descrever com clareza e uma interpretação sociocultural alguns dos principais fatos da década de 1960.

Será que 1965 - há 55 anos, portanto - foi mesmo um ano revolucionário no rock a ponto de ser considerado o mais importante?

Se o autor não prova o que título da obra vaticina, consegue fazer um panorama bem legal não só do ano citado, mas de toda a área cultural desde o ano de 1950.

Bem contextualizado, o texto mostra a gênese de alguns álbuns e singles importantes, descreve como os principais artistas as criaram e o ambiente em que criaram, citando o "clima" interno de bandas e os problemas pessoais que os envolviam.

Foi a situação de John e Michelle Philips, por exemplo, eram o casal principal do Mamas and the Papas, mas a banda quase acabou em 1965, antes do sucesso, por causa do caso extraconjugal de Michelle com Dennis Doherty, o guitarrista principal da banda (John os pegou no flagra, houve briga, mas a banda prosseguiu por anos, assim como o caso dela com Doherty).

Esse clima foi crucial para a composição de vários hits da banda, assim a paixão não correspondida da outra vocalista, Mama Cass Eliott por Doherty.



Jackson foi além, descrevendo como funcionavam as paradas de sucesso de folk, rock, pop, blues e soul, mostra como foram importantes algumas obras do período, como as de Frank Sinatra, Otis Redding, Marvin Gaye, os artistas da Motown, Stax, da cena country e do blues. Passa também, ainda que rapidamente, mas com conteúdo, pela cena inglesa de blues e rock da primeira metade dos anos 60.

Pela formação e pela paixão, o autor dedica muitas e muitas páginas ao que chama de folk rock, e Bob Dylan acaba ganhando um protagonismo exagerado, embora não fora de propósito. O músico entremeia relatos em várias partes do livro, ganhando uma análise profunda de sua obra e do impacto que vários fatos tiveram em sua música.

Para leitores que têm um conhecimento superficial da vida norte-americana daquele período, o livro traz um bônus: relatos importantes do clima político, econômico e social que marcaram a década.

Estão lá explicações sobre os principais conflitos raciais dos anos 60, as disputas políticas entre conservadores e liberais, as lutas às vezes sangrentas pelos direitos civis de minorias, as campanhas e filosofias de gente como Malcolm X e Martin Luther King, as causas do surgimento dos hippies, a decadência econômica de polos industriais como Detroit e o norte da Califórnia, o impacto que a política belicista em relação ao Vietnã e a sua desastrosa guerra tiveram na sociedade e como isso influenciou diretamente a música.

Mesmo não comprovando a tese do título, o livro de Jackson é interessante pelas informações que compila e pela contextualização necessária sobre uma época rica da arte da cultura ocidental. A conclusão é questionável, mas como obra história cumpre satisfatoriamente o seu papel.

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