Made in Brazil: Oswaldo é o terceiro da esq. para a dir. (FOTO: DIVULGAÇÃO)
Um erro muito comum quando se analisa a história do rock paulista é simbolizar os Mutantes como a cara do gênero na cidade - e pior, a cara do ritmo no Estado, especialmente citando como os nomes principais do berço roqueiro paulistano, o bairro da Pompéia, na zona oeste da cidade.
Quando escuta tal heresia, Oswaldo Vecchione prefere soltar uma gostosa gargalhada e passar para o tópico seguinte. Enquanto os Mutantes ainda engatinhavam e tentavam convencer Rita Lee a abraçar o rock, o Made in Brazil, dos vizinhos irmãos Oswaldo e Celso Vecchione, já quebrava tudo no bairro.
A estrondosa gargalhada de Oswaldo por enquanto dar lugar a um silêncio que significa a luta pela vida. O baixista e vocalista da fantástica banda de rock paulistana sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral) na tarde deste domingo, 12 de julho, no interior de São Paulo. Está internado em um hospital da capital e seu estado é considerado delicado, segundo mensagens de seu filho, Rick, nas redes sociais.
Um dos pioneiros do rock moderno, Oswaldo é septuagenário, mas mostrava disposição de jovem nos últimos tempos. As comemorações dos 50 anos de criação da banda se estenderam e o músico fazia questão de mostrar o imenso sorriso em cada ocasião de comemoração, seja em shows, seja em exposições de fotos do grupo ou em meros encontros fortuitos em bares e padarias.
Não era dessa forma que queríamos mostrar o Dia Internacional do Rock em 2020, justamente em meio à pandemia mais letal dos últimos 100 anos. A persistência de Oswaldo e do Made in Brazil, na estrada há 53 anos, nos lembrar que, mas do que paixão e vida, rock é necessidade. Precisamos de Oswaldo para nos chacoalhar todas as vezes em que incautos e tontos vomitam que o rock morreu.
Rock nas veias
Os irmãos Vecchione eram bambinos, filhos de italianos, e renegaram os ascendentes e a tradição do bairro ao preferirem o Corinthians ao Palmeiras, e isso contribuiu para a rebeldia e a fúria dos moleques para contestarem sempre que podiam e chutar todas as canelas que viam pela frente. E parece que a banda não cansa de chutar canelas, portas, baldes e cabeças, pois está na ativa há 53 anos, um feito inimaginável em um Brasil que despreza a cultura e o entretenimento de qualidade. Cinquenta e três anos de carreira... quem consegue se ombrear a tamanha longevidade, em temos de grupo? Demônios da Garoa, Azymuth, Status Quo, Kinks, Rolling Stones, Scorpions... Made in Brazil não é a principal banda de rock do país - embora muitos a considerem dessa forma, não sem razão. Também não é a mais importante, e tampouco a melhor. Entretanto, é praticamente a única banda brasileira que pode ser considerada uma instituição cultural. Isso é muita coisa. O grupo passou por tantas formações diferentes que conquistou dois recordes no Guinness World Records – banda de rock mundial com o maior número de formações oficiais (atualmente na 203ª formação) e banda de rock mundial com o maior número de participantes (126 músicos ao longo de sua trajetória). Hoje é formada por Oswaldo “Rock” Vecchione (voz, baixo e gaita), Celso “Kim” Vecchione (guitarra e baixo), Rick “Monstrinho” Vecchione (bateria), Guilherme “Ziggy” Mendonça (guitarra e violão), Octavio “Bangla” Lopes (sax), Wanderley Issa (teclado), Ivani “Janes” Venâncio (voz) e Rubens “Rubão” Nardo (voz). "Já passamos por tanta coisa e tivemos tantas experiências que fica complicado descrever o que nos faz seguir em frente. Na verdade, explicar até que é fácil, é amor à música e ao rock. Por que duramos 50 anos? Um livro é pouco para compreender a nossa trajetória e nossa motivação", diz Oswaldo Vecchione, o líder e mentor da banda. Aos 72 anos de idade, o baixista e vocalista se diverte com a enxurrada de adjetivos e elogios que a banda recebe e com a longevidade que a banda atingiu. "Instituição? O Made in Brazil é importante, mas é uma banda de rock, e é assim que queremos ser reconhecidos. A nossa importância? Vocês é que a estabeleçam e a determinem."
Foco e longevidade Em uma entrevista à revista Roadie Crew (edição 227, de dezembro de 2017), Vecchione afirmou que não imaginava que a banda durasse 50 anos. "Até conseguir o primeiro contrato com uma gravadora e estrear em disco, em 1974, só havia dúvidas. Tive meus dois primeiros filhos, rolava uma pressão da família para cortar o cabelo, comprar terno e gravata, arrumar emprego e para com essa frescura de tocar rock. Quando passei por cima disso, o resto até que foi até fácil." O líder tem uma receita que não é complicada para descrever o que faz o Made in Brazil estar na ativa até hoje. "Não podemos perder o foco, a ideologia. Mesmo com tantas mudanças de formação, eu e meu irmão Celso mantivemos o pulso firme para deixar os caras focados no que a gente queria, que era tocar rock'n'roll e blues. Isso foi fundamental para não nos perdermos pelo caminho." Oswaldo Vecchione erra feio quando despreza as declarações de que o Made é uma instituição musical, algo que ninguém ousa questionar em relação aos septuagenário Demônios da Garoa e ao cinquentenário Zimbo Trio. Em um gênero musical alienígena neste país e que desde os anos 90 vem perdendo cada vez mais espaço, é uma alegria imensa e um orgulho saber que uma banda de rock brasileira chega aos 50 anos na ativa e fazendo boa música. Que ten ham os próximos 50 anos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário