Marcelo Moreira
Ele gostava de ser o ponto fora da curva. Foi no caminho oposto dos punks quando a moda era ser punk. Decidiu ser um mod com com 15 anos de atraso, causando espanto até mesmo em Pete Townshend, o mentor do Who, que liderou por um tempo os movimento mod. Não bastasse isso, resolveu investir no jazz quando todo mundo ia para a new wave, o pós-punk e o hard rock.
Paul Weller era do contra não apenas por ser do contra. Queria apenas fazer o que tivesse vontade sem estar preso às convenções de mercado. Não é um anarquista nem um rebelde. É apenas um radical livre, se é que é possível adaptar a expressão da química ao mundo da música.
Um dos gigantes de sua geração, Weller, aos 62 anos, investe em mais uma guinada na carreira, digamos assim, com seu novo álbum, "On Sunset", recém-lançado.
Se o pop com resquício de new wave rendeu grandes obras nos anos 90, como o ótimo "Wild Wood", agora é a versão bardo que Weller abraça.
Com muito bom gosto para a criação de harmonias e uma mão direita no violão que embala o melhor que o folk britânico pode produzir, o músico construiu belas peças sensíveis e etéreas, que passeiam por uma gama de influências que vão do rockabilly ao punk rock.
"On Sunset" é mais lírico que os mais recentes trabalhos de sua autoria, e inaugura um estilo mais contemplativo e reflexivo, deixando um pouco a rebeldia de lado - mas só por alguns momentos.
Weller constrói paisagens lúgubres ao mesmo tempo em que enxerga otimismo nas sombras e em situações tempestuosas. "Mirror Ball", por exemplo, transborda melancolia, ainda que parte da letra seja forte.
A faixa-título, em suas duas versões, realça o intimismo e a introspecção, retomando o tom reflexivo em cima de base de violão que mais parece ma trilha sonora de seriado inglês.
"Village" vai pelo mesmo caminho, embora transpire emoções variadas e consiga transmitir uma mensagem mais otimista. Seus arranjos de cordas são sensacionais.
Há outras boas ideias, como em "Baptiste", que surpreende pelos arranjos à la word music, e "Earth Beat", onde Weller explora mais uma série de camadas sonoras repletas de influências diversas. "Old Father Tyme", por sua vez, recupera as raízes folk britânicas e traz um complexo jogo rítmico que é, no mínimo, instigante.
Uma voz punk em busca da melodia
Ao explodir com The Jam, em 1977, Paul Weller juntou o melhor dos mundos da época: a urgência punk com a miscelânea de influências da cultura mod, uma decisão certeira que diferenciou o trio do restante do punk inglês setentista.
Guitarrista de ótimo calibre e excelente compositor, conseguiu transitar do rock puro e básico pop mais sofisticado e de qualidade, seja com a banda The Style Council, que formou depois do fim de The Jam, ou em sua carreira solo, inaugurada nos anos 90 - escute o álbum "Stanley Road", uma das jóias do pop inglês de todos os tempos.
"Nunca me senti integrado no movimento punk. Para mim era tudo igual, um monte de bandas boas querendo mostrar seu trabalho e aparecer. A concorrência era enorme e fortíssima, ou você se diferenciava ou então ficava pelo caminho", disse o guitarrista em uma entrevista à revista Q nos anos 90.
Antes de ser opção, o revival do movimento mod era uma necessidade. "Cresci ouvindo de tudo, mas era óbvio que era fissurado por [Pete] Towshend e The Who, The Kinks, Small Faces e outras bandas inglesas que tinham raízes no rhythm & blues. Sempre gostei de rock, mas também de músicas bem arranjadas."
Não é à toa que The Jam fez versões maravilhosas para duas canções obscuras do Who, "So Sad About Us" e "Disguises", além de "David Watts" e "Waterloo Sunstet", clássicos dos Kinks. "Get Yourself Together", dos Small Faces, foi outra pérola sessentista que ganhou uma versão bacana.
E por que o jazz recebeu a sua atenção com o Style Council? "Não foi uma cooisa planejada, ou muito planejada. Eu e Mick (Talbot, tecladista que completava a formação original, depois expandida) éramos amigos e tínhamos muitas afinidades. Aquela sonoridade nos era muito familiar e surgiu naturalmente", disse Weller à BBC Radio anos atrás.
E foi assim que, de forma natural e genial, surgiram clássicos pop como "Headstart for Happiness" e "My Ever Changing Moods", músicas fantásticas que estão no topo dos grandes hits oitentistas.
Prevendo que 2018 seria um ano de celebrações além dos 60 anos de idade, Weller cometeu um dos grandes álbuns de 2017, "A Kind Revolution", uma espécie de resumo de sua longínqua carreira de 42 anos.
Tem de tudo ali, do punk mais engajado ao pop mais sofisticado embebido por jazz, soul e até mesmo rhythm and blues mais moderno, com elementos eletrônicos e letras impecáveis.
Paul Weller é daqueles artistas que dão sentido à cultura musical pop, tão necessário e inteligente quanto um dia foi David Bowie. "Stanley Road" e "A Kind Revolution" são as maiores provas disso.
Clique aqui para ver uma lista das 20 principais músicas de Paul Weller.
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