A campanha de marketing foi ridícula, mas não afetou o produto final. E então as músicas do Black Sabbath, considerado o inventor do heavy metal, viraram jazz ao comando do excelente pianista e tecladista Adam Wakeman.
Integrante mais novo do clã britânico especializado nas teclas, Wakeman, filho de Rick (ex-Yes) e irmão de Oliver, acompanhou a banda e também Ozzy Osbourne em sua carreira solo por muitos anos. Mais do que familiarizado, tem verdadeira obsessão pelo repertório do quarteto de Birmingham.
"Jazz Sabbath", o nome do CD lançado recentemente e, aparentemente, nome do projeto, tinha tudo para dar errado. O próprio Ozzy reclamou bastante, certa vez, de várias passagens jazzísticas no álbum "Never Say Die", de 1978, o seu último com a banda antes da volta, em 1996.
Entretanto, o álbum funciona se for encarado estritamente como um álbum de jazz. Esqueça que são músicas do Black Sabbath, já que ops arranjos da banda que o gravou quase que eliminam as similaridades, digamos assim. Conservaram as bases, mas os arranjos são muito interessantes.
É antiga ainda é a tradição de pegar clássicos roqueiros e transformá-los em jazz. Vem dos anos 70 essa "mania", especialmente, com canções dos Beatles e Rolling Stones.
Neste século, temos os magistrais trabalhos de Alx Skolnick Trio (projeto do guitarrista do Testament) e do Crimson Jazz Trio (que recria temas do King Crimson), para não falar em trabalhos maravilhosos no Brasil, como o Moda de Rock (clássicos transpostos para a viola caipira) e o último álbum do pianista e tecladista Ari Borger.
O marketing ruim quase estraga a boa iniciativa. No texto distribuído à imprensa, acompanhado de um pequeno vídeo supostamente sério, com entrevistas com músicos importantes, os "produtores" falam de um músico genial que teria composto um álbum em 1968 e 1969, mas que teria sido engavetado pela gravadora enquanto se recuperava de uma doença prolongada.
Recuperado, descobriu que sua gravadora não existia mais, que o dono da empresa estava preso e que o depósito onde as fitas das gravações estava pegou foto, queimando tudo.
No final do ano passado, as tais fitas teriam sido achadas num canto em um porão qualquer e o músico autor, Milton Keanes, um pianista, teria conseguido apoio para editar o material e finalmente "desmascarar" os charlatões que teriam roubado suas músicas e as transformado em rock pesado. Tudo piada, mas sem muita graça.
"Iron Man", clássico dos clássicos, tem uma performance excelente de Adam Wakeman, que fez arranjos criativos ao lado de uma banda de apoio, na segunda parte da música, afiadíssima e mostrando um jogo de cintura contagiante. É outra música.
"Rat Salad", tema instrumental por natureza, foi a música que mais se adaptou ao projeto e ganhou "novos riffs", digamos assim, onde piano e instrumentos de sopros fazem duelos memoráveis.
Assombrosa, no entanto, é a versão de "Children of the Grave", uma daquelas canões que simbolizam o peso o do heavy metal, com os riffs do baixo tenebrosos e uma guitarra que costuma demolir as paredes.
Em "Jazz Sabbath" ela se transforma um uma verdadeira suíte, com passagens intrincadas e uma miríade de riffs sobrepostos executados no piano e com um acompanhamento soberbo de metais. Outro exemplo de música completamente transformada.
Ouvindo-a sem saber que se trata de uma canção do Black Sabbath e sem conhecer a original, pouquíssimas pessoas teriam, condições de de cravar de que se trata de uma versão de "Children of the Grave". O mesmo pode ser dito de "Fairies Wear Boots".
Wakeman e os produtores foram felizes em escolher sete músicas dos primeiros álbuns, sendo que três hits estrondosos - "Changes", "Iron Man" e "Children of the Grave".
Optando por músicas como "Rat Salad" e "Evil Woman" (quem nem foi composta pelo Black Sabbath), os instrumentistas tiveram um pouco mais de liberdade para ousar e criar arranjos inusitados.
A empreitada era arriscada e tinha tudo para dar errado, mas deu bastante certo. Que Wakeman e os produtores mantenham o projeto e realizem novas versões para as músicas do Black Sabbath.
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