segunda-feira, fevereiro 02, 2009

Todos os problemas do mundo acabaram



Todos os problemas do mundo acabaram. Barack Obama assumiu a presidência dos Estados Unidos e o Copom (Comitê de Política Monetária) cortou os juros em um ponto porcentual. Tudo vai ficar bem, a crise econômica deixou de existir e os empregos voltarão a surgir em profusão neste primeiro trimestre.

A sociedade brasileira tem a tendência perigosa e extremamente arrogante de simplificar ao máximo os problemas e suas pretensas soluções como forma de mascarar a realidade e fugir da responsabilidade.

O resultado imediato desse comportamento suicida é a criação de factoides e mais factoides. O mais nojento deles nesta semana foi a ameaça de Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, deputado federal pelo PTB paulista e presidente da Força Sindical, de ameaçar invadir o Banco Central caso não houvesse redução da taxa básica de juros da economia, a Selic, na última quarta-feira. Além de inútil, pueril e mentirosa, a ameaça do sindicalista foi de uma irresponsabilidade imensa.

O fato é que ninguém se atreve a atacar os pontos que têm de ser atacados. Reduzir a taxa de juros é apenas um paliativo no combate à crise, que está engolindo a economia brasileira com uma voracidade impressionante. Afinal de contas, 654 mil demissões em dezembro último é muito mais do que indigesto, é perturbador.

Enquanto o governo federal se distrai com polêmicas inúteis – como a concessão de refúgio e asilo político a um terrorista italiano, por exemplo –, as supostas medidas de punição para empresas que estão demitindo mesmo após receber ajuda com dinheiro público ficam pelo caminho.

São meras palavras ao vento, assim como a suposta indignação de autoridades do Ministério da Fazenda e do Banco Central com os altos spreads bancários – espécie de comissões que os bancos cobram pelo risco de emprestar dinheiro. Afinal, como disse o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, baixar juros somente não resolve, “o problema são os spreads”. Os banqueiros ficam irritadinhos, dizem que as “coisas não são bem assim” e ignoram solenemente o Banco Central.

Os debates estéreis continuam em ritmo de marola, enquanto a realidade atropela todo mundo. E o imobilismo já contamina parte das entidades que representam os trabalhadores.
Em Jacareí, no Vale do Paraíba, em decisão extremamente preocupante que revela falta de democracia -, um sindicato filiado à central Conlutas, ligado ao radical PSTU, impede o acordo de redução de jornada de trabalho e salário numa empresa. O detalhe é que o acordo foi aprovado pelos próprios funcionários, diante do dilema monstruoso: sem a redução, a empresa fecha.

A ideologização da discussão sobre as formas de combater o desemprego teve o seu valor no início da crise. Foi importante para marcar posição e recolocar as centrais sindicais no debate.

O problema é que a realidade insistiu em passar por cima de tudo. As opções oferecidas até agora pelos trabalhadores foram rechaçadas ou ignoradas pelas empresas, tudo diante da passividade e da lentidão do governo federal e da omissão do governo estadual.

Rejeitar redução de jornada de trabalho com redução de salário é uma bandeira histórica dos sindicatos. Mas quando a base começa a entender que emprego é mais importante do que tudo e que salário de desempregado é zero, é sinal de que é preciso forçosamente perceber o que está em jogo.

Credibilidade e coerência são virtudes desejáveis, mas, dependendo do ponto de vista, podem se chocar com a realidade, emperrando a vida. E a realidade insiste em corroer conceitos históricos. Como lidar com isso?

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